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IRÁ SEM O “VIEIRINHA”.


Sem ir ao “Vieirinha”,
aonde Irá pensa que irá?
Quando ela sai de casa
dizendo “vou por aí”,
na certa já tem a rota antecipada
e, traçada no passo, a sina
de dobrar as dez esquinas
que atrai seu corpo como ímã
pra cair na dependência não química
e sim orgânica, da dança prazerosa,
nos alpendres do Velho Caparrosa.

E no sábado suas sandálias
voltarão em cima do rastro;
do rastro que fizera na sexta,
no arrasta-pé esfregado na praça;
rastro feito na sexta-feira
pra ser seguido pelos seguidores
da boemia num sábado.

No entorno morno do Mercado Velho
com linhas, ripas e caibros
que os cupins não deram cabo,
Irá, com cabeça, tronco e membros,
com o peso da vida nos ombros,
com sua arcada firme,
peito erguido e barriga encolhida,
preserva sua arquitetura
e evita dizer: “um dia a casa cai”

Pousando em cada mesa,
de gole em gole de cerveja,
Irá vai deixando o seu mel.
Ora abelha, ora beija-flor,
dizendo segredos ao seu copo
que não é de liquidificador,
que um dia Cazuza cantou
“em muitas orelhas frias’

De mesa em mesa
dizendo segredos para seu copo,
segue em diálogo de si para si a abelha-rainha
ora lamentos, ora ladainhas
na mesa de Arabela,
cantando “Se essa rua fosse minha”.

Rodopia numa quina de mesa
virando agora uma esquina
e por trás dela muitas más línguas,
deixando sua orelha quente
(tanto é que ela pensa alto:
"Estou com a pulga atrás da orelha").

Irá vai deixando o seu mel
"devagarinho flor em flor"
ora abelha ou beija-flor,
zumbido baixo de abelha-rainha,
fora do alcance do violão de Vieirinha,
polinizando a boemia da humanidade
ao bater de suas duas leves asas,
que nascem nas alças do sutiã
dando asas à imaginação dos fãs
sobre se a abelha-rainha ainda usa anágua
ou se porta mágoas sobre o cofre do seu segredo
que ela sussurra ao copo da cerveja,
enquanto as línguas dos namorados giram nas orelhas
“dizendo segredos de liquidificador”

Levando o bico à borda do copo
em busca do açúcar do seu próximo,
segue Irá polinizando a humanidade
das humildes pessoas da cidade
que se abrem para ela como girassóis
virando pescoço e olhares
para que ela pouse em cada mesa,
buscando o açúcar e o malte da cerveja.

O "Vieirinha" sem Irá
é quase como o gerais sem chuva,
ou melhor, o gerais sem caju,
ou, melhor ainda: um pintura de Randesmar
sem as chuva dos cajus;
o Cerrado de sua tela
florescendo pétalas e árvores.

O “Vieirinha” sem Irá
muito perde o aroma e o sabor:
é como roer um pequi sem sentir seu olor

É certo que fica deserta a praça
sem a presença discreta dela, 
sem ela dar o ar de sua graça,
vestida em chitas e entretela,
com batom básico, sem maquiagem,
pra não descorar a sua imagem
de personagem do rio Grande.

O bar “Vieirinha” sem Irá
é como se acabasse de chover
e só a chuva usasse as mesas e cadeiras,
derramando sobre elas a sua “saideira”;

O “Vieirinha” sem o ar da graça de Irá,
perde toda a graça,
e a praça ganha seu vazio,
como quando cai a chuva,
mesmo que Irá, sozinha,
se atreva a ir na chuva de sombrinha
pra sair da sombra de suas trevas,
pra não ficar em casa entrevada.

Mesmo estando agora no “Beirute’
e achando que estava no "Vieirinha",
caminhando mais adiante, 
entre dez biritas, sem estar biruta,
achando-se e perdendo-se
entre barreirenses e gaúchos.

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